Idealizado por Yasmin Martins Mendes e Diego Esteve, Festival Internacional de Cinema de Carazinho celebrou as mulheres no cinema em sua primeira edição
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Criado pela atriz e roteirista Yasmin Martins Mendes, em parceria com o cineasta Diego Esteve, o Festival Internacional de Cinema de Carazinhochega ao fim nesta quinta-feira, dia 20 de novembro. Ao longo de sete dias, com uma programação inteiramente gratuira, o festival reapresentou a sétima arte à cidade gaúcha, que há mais de uma década não via o interior de uma sala de cinema; e, principalmente, celebrou produções realizadas e/ou estreladas por mulheres.
Em entrevista à Rolling Stone Brasil, Yasmin revelou que, desde que teve a ideia para o festival, sempre quis dar destaque às mulheres, partindo do legado de Alice Guy-Blaché, inventora do cinema narrativo: “Comecei a frequentar algumas aulas de cinema no Rio e nunca se mencionava a Alice. E, então, fui a um festival internacional e tinha uma exibição da Alice e fiquei [questionando]: ‘Como essa mulher não é falada? Como essa mulher é esquecida?'”, explica.
“Nós precisávamos falar das primeiras mulheres. Tem muita mulher que é brava, que é pioneira. Tem tantas mulheres que mudaram a história do mundo. De poder votar, de poder ter uma profissão”, acrescenta. “O [tema] ‘Pioneirismo Feminino’ vem das tantas mulheres que são desbravadoras e, por algum motivo, são apagadas. Elas são esquecidas. Alguém sempre é colocado no lugar delas de alguma forma.”
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Fazendo história, película por película
Além de Alice Guy-Blaché, o Festival Internacional de Cinema de Carazinho também homenageou Adélia Sampaio, primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem no Brasil. À Rolling Stone Brasil, a cineasta reviveu memórias de quando, após se apaixonar pelo cinema aos 14 anos, decidiu que queria habitar a tela que tanto amava:
“Eu fui assistir a Ivan, O Terrível, um filme russo [de 1944], e saí de lá encantada. Minha irmã foi quem me levou e disse: ‘Mas por que esse encantamento?’ Eu falei: ‘Eu vou fazer isso’. Eu tive o ímpeto de entrar naquele lugar. Aquela viagem doida de criança. Eu tinha muito essa fantasia. Então, eu disse: ‘Eu vou entrar nessa tela!”, relembra.
Adélia — que, aos 85 anos, repreende com veemência quem ousa chamá-la de “dona” ou “senhora” — confessou que a sorte lhe sorriu no começo da carreira: “O primeiro emprego que arrumei foi como telefonista em uma empresa de cinema, a Difilm [Distribuidora de Filmes Ltda.], que aglomerava todo o Cinema Novo. Eu convivia com todos os cineastas e, um dia, eu [decidi]: ‘Vou fazer meus curtas'”, conta.
Para a tarefa, a cineasta começou a recolher sobras de películas de filmes do estúdio, que normalmente eram descartadas. Adélia as preservava enroladas em jornais preservando-a em jornais e guarda em uma geladeira velha em sua casa, que ninguém podia tocar: “Ela era velha de propósito!”, brinca.
Com o conhecimento adquirido no trabalho, Adélia rodou o seu primeiro curta-metragem, Denúncia Vazia, lançado em 1979. Estrelado por Catalina Bonakie e Rodolfo Arena, o filme contava a história de um casal que, ao ser despejado de sua casa, decidia tirar a própria vida. Foi a primeira produção cinematográfica de uma mulher negra no Brasil. No entanto, apesar do marco, a carreira da cineasta não andou a passos largos após o primeiro:
“[As coisas] melhoram e não melhoram. Porque, se você é preto e pobre, já é esquisito. Mulher então? Fodeu. Então é complicado, mas nós começamos a fazer umas escorregadinhas. Tinha uma equipe técnica, que a gente chamava de equipe da pesada, e eram todos pretos. E eu me juntava a eles e, com isso, fui ganhando espaço para essas pessoas”, relembra.
Em 1984, Adélia fez história mais uma vez, registando o seu nome para sempre na história do cinema brasileiro: com Amor Maldito, que abordava um romance entre duas mulheres, algo revolucionário para a época, ela se tornou a primeira mulher a dirigir um longa de ficção no Brasil. Porém, apesar do legado, a cineasta tem uma visão ainda mais íntima sobre a sua história com o cinema:
“São recordações que nós vamos deixando pela vida afora. Os meus netos assistem [aos filmes] hoje e dizem: ‘Vovó, você fazia isso?’ Para eles, é muito estranho, mas o cinema não pode morrer. Coisas como essas, que estão ocorrendo aqui, provam que o cinema vai prosseguir”, declarou ao receber o prêmio Life Achievement no Festival Internacional de Cinema de Carazinho.
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Uma loba entre os cisnes
O Festival Internacional de Cinema de Carazinho ainda homenageou o trabalho da cineasta Helena Varvaki, que recebeu cinco Carás de Ouro por Um Lobo Entre os Cisnes, longa sobre a história real e inspiradora de Thiago Soares, um garoto do subúrbio carioca apaixonado pela dança, que é selecionado para integrar uma importante escola de balé clássico e decide dar um salto de fé, deixando para trás o sonho de se tornar um dançarino de hip hop.
A produção conquistou o prêmio mais cobiçado da noite, o de Melhor Filme, além de Melhor Ator Protagonista, Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Roteiro e Melhor Direção, que foi entregue a Helena Varvaki por Adélia Sampaio, em um dos momentos mais simbólicos e emocionantes da premiação.
“Eu vou guardar isso para sempre. O processo de criação desse filme foi de muita transformação artística e pessoal. Então, esse momento agora é a confirmação de um caminho, é a abertura de um caminho. Eu estou muito emocionada”, celebrou a cineasta à Rolling Stone Brasil.
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